Com as portas e janelas
escancaradas, a rua atapetada com flores e ramos de verdura, as jarras obesas
com flores frescas acabadas de apanhar, “lá em baixo no campo”, aguardávamos,
com o nervosismo de figurantes em noite de estreia, a entrada em cena do
Compasso.
Este fazia-se anunciar lá
longe mas desde que o ouvíamos até que chegasse à nossa porta passava muito
tempo, demasiado tempo para a minha impaciência infantil.
Até que – anti-clímax! -
chegava o Compasso. Reuníamo-nos todos na entrada da casa, eu, sem perceber
nada, imitava os demais, ajoelhada, baixava a cabeça, encenando uma santidade
que nada tinha a ver comigo, ouvindo sem entender a ladainha do Sr. Abade, mas
sempre à espera do “ataque” à sala do lado.
Tudo isto se passava em casa
dos “Padrinhos”, que não tiveram nunca outro nome mas que para mim funcionaram
como os avós que não tive. Eram os “Padrinhos” para todos nós - embora fossem,
na verdade, Padrinhos de baptismo e de casamento de minha mãe, de baptismo e de
casamento de meu irmão mais velho e, ele, Padrinho de baptismo de meu outro
irmão. Guardo deles as recordações possíveis, passadas que são mais de quatro décadas sobre as suas mortes. Recordações quase sempre de festas e de almoços
de família – era o Natal, o Ano Novo, por vezes os Reis, com as rabanadas de
vinho, o bolo-rei vindo do Porto, com diâmetro de pneu,
“queijo branco” (da serra, por oposição ao flamengo, “amarelo”) apenas um pouco
menos ancho do que o bolo-rei, a Páscoa, muitos, muitos Domingos, o almoço
semanal na nossa casa do Porto.
(…)
Excerto de um original
de Maio de 2013, blog Paodecereais
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