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quarta-feira, 4 de março de 2015

O NOSSO FIM DE SEMANA NA SERRA DA ESTRELA

Hoje é 6ª feira, véspera do último fim-de-semana do mês de Janeiro e estou excitadíssima – vamos passar o fim-de-semana à Serra da Estrela!!!
Não vou lá, no Inverno, há quase vinte anos, na verdade, a última vez que lá estive foi num Carnaval alto (fins de Fevereiro) em que, por força de um Inverno rigoroso, a Serra estava coberta de neve e só as estradas estavam limpas, serpenteando por entre os maciços da alta e fofa cobertura branca, que mais parecia claras ou chantilly batidos, mas o tempo estava magnífico – calor e Sol todos os quatro dias em que lá estive, um céu que, de tão azul, me parecia turquesa, e, claro, todas as outras coisas boas que ficaram para memória futura, pois a única má de que me lembro foi ter que vir embora.
Hoje, quase vinte anos depois, é 6ª feira e vamos passar o fim-de-semana à Serra, saímos de Lisboa em três carros, daqui a pouco, ao fim da tarde, encontramo-nos com a minha irmã e sobrinha na Área de Serviço de Sarnadas e todos para jantar no Fundão, num restaurante muito recomendado, aí pelas 8h / 8h30.
Mas hoje é a última 6ª feira do mês de Janeiro, o mais comprido do ano, e já toda a gente deve ter recebido os ordenados, pois, a par do nosso carro, há milhares doutros a quererem sair de Lisboa…

O primeiro percalço aconteceu com a saída – apesar de a bagagem estar pronta e alinhada à porta de casa desde, pelo menos, a antevéspera, para permitir uma saída rápida da confusão dum fim de dia, ademais 6.a feira, o certo é que houve complicações de última hora no escritório e arrancamos para o destino com duas horas de atraso; a bem da verdade, pusemo-nos a caminho à hora em que deveríamos estar a chegar ao Fundão. Nós e, imaginamos nós, os nossos amigos que, noutros dois carros, tinham igualmente como destino os dois bungalows que alugamos para o fim de semana. E todos estamos a pensar que todos estamos no mesmo barco (melhor dizendo, no mesmo engarrafamento) por isso os atrasos vão ser paralelos.

 Isto dito, quase hora e meia depois de sair de casa, conseguimos chegar a Vila Franca. Aqui chegados, Mlle ptc (ou seja, moi), dona de certezas inabaláveis, determina que se faça a saída da A1 com destino a Sul – ou seja, por Ponte-de-Sor-sur-mer, e isto porque a estrada depois de Torres Novas era um horror, pois Mlle ptc bem o sabe, porque há dois anos (dois anos, note-se!!!) tinha andado a correr para a Covilhã quase todos os meses e o melhor caminho era, indubitavelmente, o do Sul (isto, claro, dois anos antes…).
Meu dito meu feito, e lá vamos nós, grupo excursionista número 1., pelo caminho de Ponte-de-Sor-sur-mer (muito mais pitoresco, não se cansa Mlle. Ptc de repetir, embora ninguém queira ouvir, porque lá fora está escuro como bréu e o pitoresco deve ter acabado cerca de três ou quatro horas antes, quando ainda havia réstia de sol…).
Chegados a Taipadas, a ausência de sinalização faz-nos cair no segundo percalço e obriga-nos a desviar mais para Sul do que o pretendido – uma estrada rendilhada de buracos e covas capazes de partir qualquer suspensão, mesmo a de um 4*4, e, 50km depois (a uma velocidade média de 30km), damos conta de que estamos a chegar… a Mora!

O condutor, cheio de uma paciência digna da maior admiração, consegue não soltar qualquer imprecação, faz meia volta na primeira oportunidade, e lá vamos nós, a bisar mais 50km da magnífica estrada municipal, do melhor que a rede autárquica tem para nos oferecer.
Mas não faz mal, hoje é sexta-feira e vamos passar o fim-de-semana à Serra da Estrela…
Retomado o caminho, por mais umas estrada municipais de primeiríssima qualidade, conseguimos encontrar o IP2, embora o percamos amiúde, pois o IP2 é muito brincalhão e gosta de jogar às escondidas – chato, chato, é que se esconda dos automobilistas, a sua razão de existir...
Cerca da 1h da manhã – cinco horas depois do jantar aprazado e com os estômagos cheios de crateras iguais às da Estrada Municipal de Mora – avistamos a Área de Serviço de Sarnadas, onde irmã e sobrinha congelam desde as 6h ou 7h da tarde, pois não podem ligar o aquecimento do carro por dois motivos – o primeiro, óbvio, a segurança, o segunda, o tacho com diâmetro de pneu de camião que contém a grande feijoada que será o almoço de amanhã (ou seja, hoje…) dos 12 excursionistas, oito adultos, uma adolescente e três crianças.
Enquanto se mudam malas e sacos dum carro para o outro, uma bala vermelha passa por nós – era um dos carros saídos de Lisboa ao mesmo tempo que nós, mas não houve tempo para estabelecer contacto.
Estamos a sair de Sarnadas – “Agora é um tirinho”, diz Mlle ptc, mais para dizer qualquer coisa do que convencer os outros, pois o tiro tinha o longo alcance de 100km, vinte e cinco dos quais numa Serra coberta de Neve.


São três da manhã, já é Sábado de madrugada do último fim-de-semana de Janeiro, e acabamos de chegar aos bungalows – a bala vermelha já tinha chegado, apenas 10 minutos antes, ainda faltava um carro.
Acabamos de nos distribuir pelos bungalows, o cansaço foi anulado pela adrenalina da viagem, os pés e membros inferiores estão enregelados por se terem enterrado na fofa neve até ia dizer joelhos mas deve ter sido só até às canelas, tiramos o calçado (inapropriado para a ocasião, é mister dizer) e surgem umas meias fumegantes, que ficam devidamente registadas em fotografia para a posteridade.
São quatro da manhã, o terceiro carro, que também andou pelos lados de Mora, chega finalmente ao destino e todos ficamos aliviados – chegamos em segurança, é o que conta! - e eis que o cansaço nos vence. Recolhemos aos nossos quartos, moídos e cheios de sono, e muito menos excitados pela perspectiva futura do fim-de-semana na Serra da Estrela, que já ia a meio embora mal tivesse começado.
(…)
Agora já é Domingo, dia de regresso, depois de uma das crianças ter visto pinguins, cuja comoção lhe provocou de seguida uma otite, e Mlle ptc cala o bico, não manda mais palpites, pelo que o percurso se faz pelo IP2, com paragem no Fundão para almoço (uma feijoada de lebre), na AS de Sarnadas para apanhar o 2CV da minha irmã, seguindo sempre pela margem Norte do Tejo até à A1, nó de Torres Novas. Demoramos umas 4horas, almoço incluído – apenas metade do tempo da viagem de ida...
(…)
Esta estória não aconteceu – nem nunca poderia ter acontecido - no último fim-de-semana de um qualquer mês de Janeiro do século XXI, aconteceu num Janeiro em que as únicas saídas de Lisboa para Norte eram a A1 ou a EN10, em que não havia nem CREL nem CRIL, e para Sul só existiam a Ponte 25 de Abril e a de Vila Franca, num Janeiro dum ano em que se começavam a vender muitos mas muitos carros novos…
E claro, num ano em que não havia telemóveis – ou os que havia custavam, à data, 500 contos (2500€ a preços actuais, sem actualização nem correcção monetária) e só eram móveis porque equipavam um veículo automóvel, ao qual estavam umbilicalmente ligados, até porque eram do tamanho dum tijolo. Escusado será dizer que nós, filhos da classe média muitíssimo remediada, não tínhamos dinheiro para esses tijolos, sem os quais vivíamos, aliás, lindamente, até porque sempre conseguimos chegar ao destino e encontrar aqueles com quem queríamos estar…
É que se houvesse telemóveis (ou seja, celulares) como hoje, entre trinta sms, emails e telefonemas, teríamos saído igualmente tarde de Lisboa, mas estaríamos sempre a cronometrar distâncias, percursos e localizações, ter-nos-íamos igualmente perdido em Taipadas, a caminho de Mora e não de Ponte-de-Sor-sur-mer, mas tal facto teria sido abundantemente partilhado em todas as redes sociais e até o Zuckerberger se teria rido do mesmo, e, teríamos chegado às Penhas da Saúde na madrugada de Sábado – uns às 3h outros às 4h, mas sempre em rede e perfeitamente conscientes do que se estava a passar…
O que, sem dúvida, teria contribuído imenso para a nossa felicidade (?!) imediata mas não teríamos era ficado com estória nenhuma para contar no futuro…

2 comentários:

  1. O que sofreram irmã e sobrinha num Citroen 2cv... O cheirinho a feijoada, a fome e o frio... Já para não falar do aborrecimento que era ter apenas um (i)rádio em vez de um iPad ou iPod com todas as aplicações e mais algumas à disposição... Mas valeu a pena! As noites iluminadas pela neve, a companhia e o "sku"... e as meias de uma "teen" a fumegar... Será que conseguimos recriar?

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  2. minakika, podemos sempre tentar mas NUNCA será a mesma coisa... mesmo deixando os ipods, ipads, iphones e gps em casa. Até porque hoje há tanta AE e exSCUT desertas que nunca correríamos o risco de perder horas no caminho ou mesmo de perder o próprio caminho!
    But we will always have that weekend...

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