Penélope costumava dizer que de bom grado deixava o bom gosto todo para os outros e que ela se bastava com ter o gosto de gostar de amarelo.
Tudo começou por acaso, que é como quase tudo
começa, a mãe, costureira numa loja de pronto a vestir, trazia, no fim de cada
estação, os monos a que dava a volta e transformava em roupas decentes para
Penélope e Ulisses, os gémeos que havia tido com Ambrósio, seu falecido – não
porque ele se finara mas porque se finara o casamento – as cores claras e
alegres, como o amarelo e o vermelho, eram para Penélope, as mais discretas –
azul e verde (credo, escarro na parede!)
para Ulisses. Mas, num Carnaval, Ulisses tivera direito a um fato azul e
vermelho com o super-homem estampado, enquanto Penélope se vestira de veludo
azul, como a Pequena Sereia, aquela cuja verdadeira história nada tinha de
Disney mas era sim um repositório de horrores e de violência de género –
maldito Andresen!
Reflectia Penélope, enquanto desfazia a teia de
dia tecida - de fio amarelo claro ou será de fio amarelo, claro? -, que ainda bem que tudo se passara há umas décadas pois se fosse
agora teria a pobre da mãe sido acusada de perpetuar estereótipos de género.
E Ulisses, que não havia meio de chegar...
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