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terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

A TEIA DE PENÉPOLE

 Penélope costumava dizer que de bom grado deixava o bom gosto todo para os outros e que ela se bastava com ter o gosto de gostar de amarelo.

Tudo começou por acaso, que é como quase tudo começa, a mãe, costureira numa loja de pronto a vestir, trazia, no fim de cada estação, os monos a que dava a volta e transformava em roupas decentes para Penélope e Ulisses, os gémeos que havia tido com Ambrósio, seu falecido – não porque ele se finara mas porque se finara o casamento – as cores claras e alegres, como o amarelo e o vermelho, eram para Penélope, as mais discretas – azul e verde (credo, escarro na parede!)  para Ulisses. Mas, num Carnaval, Ulisses tivera direito a um fato azul e vermelho com o super-homem estampado, enquanto Penélope se vestira de veludo azul, como a Pequena Sereia, aquela cuja verdadeira história nada tinha de Disney mas era sim um repositório de horrores e de violência de género – maldito Andresen!

Reflectia Penélope, enquanto desfazia a teia de dia tecida - de fio amarelo claro  ou será  de fio amarelo, claro? -, que ainda bem que tudo se passara há umas décadas pois se fosse agora teria a pobre da mãe sido acusada de perpetuar estereótipos de género.

E Ulisses, que não havia meio de chegar...

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